Em Portugal, há uma incrível variedade de enchidos. Os ecossistemas, as singularidades climáticas, os animais de raças bem adaptadas aos locais que junto com a tradição e o saber fazer, são os ingredientes que construíram a diversidade da charcutaria portuguesas e dos seus enchidos.
Entre os porquês da tradição dos enchidos está a ideia de se aproveitar tudo e evitar o desperdício.
História
Em tempos em que não havia eletricidade nas habitações e o frigorífico ainda era desconhecido ou nem existia, as carnes eram colocadas na “salgadeira” uma arca em madeira e coberta com sal. Era desse modo que se conservava a carne que dava para o ano todo! Outra forma disponível e decorrente do engenho rural para preservar as outras partes do animal, pois tudo se aproveitava, era através do fabrico de enchidos.
Para produzir um enchido, genericamente, as várias partes do porco (o animal mais utilizado) – carnes, ossos, sangue, gorduras - após a desmancha, são dispostas e tratadas como categorias distintas. Cada uma dessas partes tem o seu destino.
Tradicionalmente, as partes consideradas “melhores”, iam para as salgadeiras para mais tarde serem cozinhadas, servindo como iguarias de maior honra e prestígio. As peças menos “nobres” destinadas aos enchidos são cozidas e colocadas em alguidares de barro vidrado onde são temperadas e misturadas com outros ingredientes – a massa - para seguidamente encher tripa natural de vaca salgada. Depois de produzidos os enchidos, são curados (processo de secagem) e fumados até ao próximo abate.
De entre os inúmeros enchidos portugueses a “Alheira” goza de grande prestígio e notoriedade. Reconhecida pela tonalidade amarelo-acastanhado e em configuração de ferradura, a alheira, em geral, é obtida a partir de uma “massa” resultante da amalgama de carnes, pão e condimentos. A carne de porco de raça Bísara e carne de aves é obrigatória, tal como o pão regional de trigo, a banha de porco e o azeite de Trás-os-Montes DOP. Podem ser incluídas carne de animais de caça. Sal, alho e especiarias, os condimentos mais usuais.
Cada zona de produção tem as suas particularidades, entre elas o fumeiro, que pode variar dependendo, por exemplo, do tipo de madeira – carvalho, oliveira, turfa, salgueiro, choupo, castanheiro - que dá a lenha para o fumeiro.
A boa alheira deverá ter o seu interior de consistência uniforme constituído por uma “pasta fina e grumosa, na qual se apercebem pedaços de carnes desfiadas”.
As alheiras de maior tradição e qualidade têm sua origem no norte de Portugal, sobretudo na região transmontana.
IGPs
Três alheiras Portuguesas possuem a distinção de Indicação Geográfica Protegida (IGP), uma certificação oficial da União Europeia para produtos gastronômicos ou agrícolas tradicionalmente produzidos em uma área específica:
Alheira de Mirandela IG (a mais famosa e reconhecida por sua qualidade, tendo sido nomeada uma das 7 Maravilhas da Gastronomia de Portugal
Preparação
Preparada da forma correta conseguimos ficar com as várias texturas da alheira, o estaladiço da pele, sentimos as especiarias, o típico fumado, a consistência da massa e a boa gordura a propagar-se no paladar.
A alheira, pode chegar ao nosso prato cozinhada de várias formas. Mas para a nossa harmonização com vinho, o foco vai para a preparação mais tradicional, aquela em que a alheira é cozinhada com vagar por 40 a 60 minutos em fogo brando tal como se fazia nos longos e duros invernos transmontanos em que a alheira assava lentamente sobre brasas. É fazer assim, se quiser fazer tal qual um verdadeiro transmontano.
Harmonização
A alheira pode vir acompanhada de guarnições variadas, mas para simplificar na ligação com o vinho, apontaremos o vinho à preparação descrita, que é aquela em que desfrutamos ao máximo da sua identidade, sem “interferências”.
Da parte do vinho, é necessário que este possua intensidade de sabor, persistência e alguma riqueza aromática para fazer face ao prolongado sabor da alheira. Deverá estar bem sustentado em fruta, ter algum volume de boca e ser bem provido de acidez e taninos. Nem um nem outro em demasia. A acidez deve ser do tipo refrescante e não cortante, apesar da gordura. Evitar taninos muito austeros, ainda assim que sejam viçosos e de boa textura.
Também não será de descartar os espumantes. Não precisamos de fazer saltar a rolha dos espumantes mais complexos ou demasiado refinados. Precisaremos, sim, de alguma estrutura, de bolha firme e não fará mal nenhum alguns toques de frutos secos ou padaria. Os espumantes rosés ou blanc de noir talvez sejam os mais indicados, pelas razões mencionadas.
Aqui estão algumas sugestões de vinhos para a criação de um belo momento gastronómico.
Vinhos Brancos
Vinhos Tintos
Vinhos Espumantes e Pét-Nat
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